terça-feira, 25 de maio de 2010

A escravidão nos ciclos de cana-de-açúcar

      Desde seu primeiro ciclo no século dezesseis, até hoje, a produção da cana-de-açúcar conserva algumas características marcantes. Subvencionada pelo Estado; exploradora de mão de obra escrava; concentradora de grandes porções de terra; agressora do meio ambiente.
     Apesar da roupagem moderna e ecologicamente correta divulgada pelo marketing da indústria automobilística, é das senzalas do corte de cana de açúcar que mais se libertam trabalhadores em situação de trabalho escravo. Somente de janeiro de 2007 a setembro de 2009, segundo dados da comissão Pastoral da Terra 6855 foram libertados no setor sucroalcooleiro nas operações de fiscalização coordenada pelo Ministério do Trabalho e Emprego. O número representa 48,8 % do universo de 14045 trabalhadores libertados da situação de escravidão no período.
   No setor campeão em casos de trabalhos escravo o Banco Nacional de Desenvolvimento Social tem investido de forma robusta. Somente o ano passado R$ 6,5 bilhões foram repassados para produção, instalação de novas usinas e distribuição do etanol combustível.
     A febre do combustível tem alcançado números recordes. De acordo com os números divulgados pelo Departamento de Combustíveis Renováveis do Ministério de Minas e Energia (MME), no anos de 2008, o Brasil exportou 5,16 bilhões de litros de etanol, de um total de 24,5 bilhões de litros produzidos no ano passado, a maior produção de toda história. Também pela primeira vez, superando em litros o consumo de gasolina.
     Na onda do boom de produção, as pretensões do setor sucroalcooleiro são grandes para o Mato Grosso do Sul. A geografia privilegiada (em planície), a terra vermelha de excelente qualidade, isenções de impostos por parte do Governador André Puccinelli e a mão de obra barata dos indígenas tem atraído investimentos de empresas como Mitsubish, Cargill, Lloyd Dreyfus .
    Assim, até o ano de 2012, está planejada a construção de 51 novas usinas de álcool no estado e -- como  obra do Programa de Aceleração do Crescimento -- a construção de um alcoolduto de 920 quilômetros que ligará Campo Grande até o Porto de Paranaguá para o escoamento do combustível produzido na região Centro-Oeste para exportação.
    Contra o avanço do setor sucroalcooleiro no estado do Mato Grosso do Sul (recebeu este nome em 1977 por sua grande área de densa de mata atlântica e que hoje já não existe), se encontram os mesmos indígenas que trabalham nas usinas e reivindicam ainda hoje seus territórios.
    Segundo o relatório do Conselho Indigenista Missionário, entre os anos de 2006 e 2008, 1100 trabalhadores dos povos Guarani Kaiowá e Terena foram liberados no estado pelo Ministério do Trabalho.
    "O estado demorou muito para efetivar o direito à terra, pelo menos 15 anos. Se tudo fosse cumprido como manda a Constituição de 88, não estaríamos nesta situação. Não teríamos que enfrentar os níveis de suicídio, violência, escravidão no corte de cana ou desnutrição" reconhece a administradora da Fundação Nacional do Índio para Região de Dourados, Margarida Nicoletti, referindo-se ao prazo de cinco anos dado pela Constituição Federal de 1988 ao Estado para que todas as terras indígenas fossem demarcadas no Brasil.
    Em luta pela retomada de suas terras, o povo Guarani Kaiowá, (a maior população de um povo indígena no país) com uma de cerca de 45 mil pessoas segundo a Funasa, tem vivido o que organismo internacionais de defesa dos direitos humanos classificam como etnocídio.
    Sofrendo com graves problemas de subnutrição e suicídio pela falta de espaço para produção de seus alimentos e reprodução de sua cultura, insistem em enfrentar os fazendeiros que hoje surfam na onda do etanol para retornar ao seu território tradicional. Na luta desigual, nos últimos quatro anos, sete lideranças foram executadas por jagunços.

Fonte: http://www.brasildefato.com.br/v01/agencia/especiais/especial-bndes/a-escravidao-nos-ciclos-de-cana-de-acucar/view

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